PESCA DA TAINHA EM SANTA CATARINATexto e Fotos DadáSouza
Começou dia 15 de maio a temporada de pesca da tainha no litoral catarinense. O período de pesca vai até o dia 15 de julho e durante esses dois meses, quase todas as praias do Estado ficam fechadas para a prática do surf e de outros esportes aquáticos. Os pescadores dizem que os surfistas e turistas espantam o peixe. Os surfistas querem aproveitar o mar e suas ondas, que durante o inverno ficam maiores e melhores. Com interesses conflitantes, os atritos e as agressões infelizmente são bem comuns.
Como surfista, já tive que correr de pescador, já entrei em diversas discussões e até já surfei quando não podia, só para pegar duas ondas e sair correndo. Mas muita gente se deu mal, apanhou feio e foi ameaçado com facão. Muita gente teve suas pranchas apreendidas ou quebradas porque tentaram entrar no mar para pegar algumas ondas. Mais tarde, seguindo o velhque dizo ditado que diz “se não pode vencê-los, junte-se a eles", passei a procurar conviver com o pescador, a admirar o trabalho e a lida dura da pesca, e a entender um pouco mais desse outro lado da história, que envolve um grupo grande de gente que vive e que depende da pesca para sobreviver.
A proibição do surf e dos esportes aquáticos muda um pouco em cada cidade catarinense, os quais determinam se haverá ou não praias ou trechos liberados para a prática do surf. Apesar de toda a falta de embasamento que justifique a evacuação do mar e dos grandes constrangimentos que os surfistas vem passando, esta determinação vem funcionando até hoje, mais pelo fato de os pescadores serem um grupo muito mais organizado do que os surfistas, do que por alguma real necessidade de evacuação do mar. Na visão dos surfistas e dos turistas, a proibição é puro exagero, mas os pescadores estão todos registrados, aparecem nas votações com seus títulos de eleitor na mão, dizem quantos votos representam e fazem valer seus direitos. A pesca é uma atividade tradicional, milenar, e seus trabalhadores são gente simples e que dependem da pesca para sobreviver. Já os surfistas não se unem para lutar por seus direitos e acabam proibidos de pegar suas ondas. O surf é um esporte que movimenta milhões de dólares e que tem milhões de praticantes e admiradores país, principalmente em Santa Catarina, Estado que respira o surf. Mais do que um esporte, o surf é uma pratica milenar e uma profissão para muitos atletas. Seus números são tão grandes quanto os relacionados a pesca artesanal. Sem falar que o nosso esporte convive de forma exemplar com a praia, com o meio ambiente e com as espécies marinhas. Mas enfim, a proibição é lógica? A briga é injusta? Para que todos possam entender um pouco mais sobre a questão, coloco aqui alguns fatos e algumas visões sobre o tema.
O LADO DOS PESCADORESA pesca é uma das atividades mais tradicionais do Estado de Santa Catarina. Tanto que muitas de cidades litorâneas de Santa Catarina foram criadas e desenvolvidas a partir da pesca artesanal, que é uma das atividades mais queridas e respeitadas por todos. Os pescadores são pessoas simples, que vivem quase que exclusivamente da pesca, de onde tiram o sustento de suas próprias famílias, além de colaborarem para a indúsrtia da pesca da pesca em todo Brasil. Uma classe de trabalhadores que deve sempre ser escutada e protegida. A portaria que determina o período da pesca da tainha apenas faz valer essa proteção aos pescadores que têm na safra sua maior fonte de renda, sendo esse o maior motivo para defenderem tanto a pesca da tainha. Durante este período, os cardumes sobem pela costa brasileira para fazer a desova da espécie, e os pescadores utilizam essa oportunidade para garantir uma boa pesca e o seu sustento. Para muitos pescadores, essa tradição é sua única forma de sustento, ou um bom incremento em suas rendas. É a famosa “Tainha das Ovas de Ouro”.
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Rodrigo Pereira Medeiros, surfista, oceanógrafo com mestrado em ecologia e doutorado em sociologia política, disse no site www.waves.com.br que "a pesca de arrasto de praia mantém um sistema complexo de pescaria. Não se trata somente do ato de puxar rede, porque existem diversas pessoas envolvidas e uma certa divisão de funções – o vigia, os tripulantes (mestre, remeiros, e chumbeiros que lançam a rede na água) e existe a divisão da captura – o quinhão. O arrasto de praia também é um ritual de renovação dos laços comunitários, em que a comunidade (homens, mulheres, crianças e idosos) se reúne na praia e as pessoas trocam sentimentos de respeito, pertencimento e de reciprocidade. Rodrigo Medeiros dia ainda que pesca da tainha é muito mais que um processo produtivo-econômico, é um momento de manifestação do “território da pesca artesanal”. Porém, não deixando de lado a dimensão econômica, numa pesquisa que realizei no Pântano do Sul, os pescadores chegam a quadruplicar a sua renda durante esses dois meses. E isso tem uma importância muito grande, pois é o momento onde ele pode melhorar a sua casa, ou fazer uma reserva para os “meses de miséria”, quando a produção é baixa. Atualmente os pescadores do arrasto de praia estão revoltados e quase marginalizados, já que seu próprio representante – a FEPESC - favoreceu uma pescaria bem mais agressiva, maior e mais individualizada, ao contrário do arrasto de praia que envolve diversas famílias por comunidade".
É uma profissão, esteja em alta ou em baixa, deve ser respeitada
"Os surfistas são os “haoles” neste momento, pois atrapalham aquele momento comunitário, que pertencem a eles pescadores e não a nós surfistas. Além disso, eles esperam pelo peixe, e não buscam pelo peixe, capacidade que nós surfistas, em geral temos na nossa busca. É muito mais fácil para nós buscarmos ondas em outras praias, do que para os pescadores buscarem peixes em outras praias. Nossa forma nômade de surfar muitas vezes não respeita os processos comunitários que acontecem nas praias catarinenses", conclui Rodrigo Medeiros.
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A pesca da tainha garante o alimento e o sustento de muitas famílias. Quando a pesca é farta, a comunidade local faz a festa!
Os pescadores reclamam que a prática do surfe espanta os cardumes e prejudica a pesca nas praias onde são usadas redes de pesca artesanais.
Eles defendem também, que as pessoas respeitem uma tradição de gerações. E acreditam ser justo também, terem o direito sobre as praias pesca na maioria das praias, tendo em vista que são pessoas nativas, que mantém a tradição e que tiram seu sustento do mar. Além disso, o período de pesca da tainha ocorre somente durante dois meses. Os surfistas têm 10 meses com 100% de liberdade. E mesmo durante os meses da tainha, algumas praias (a grande maioria delas são constantes e de boas ondas) ficam liberadas (parcialmente) para a pratica do surf. Não é um período de total proibição mesmo porque, muitos pescadores têm o costume de liberar o surf quando o mar sobe e as grandes ondas não deixam as canoas entrarem.
Os pescadores dizem que mesmo com todas essas discussões, não há o que reclamar. Além de acontecer por um período curto de tempo, existem as bandeiras informativas (se a praia esta liberada ou não para o surf)e existem muitos picos alternativos. A maioria dos casos de confusão é gerada por pessoas que não moram na praia e chegam em nosso litoral sedentas por ondas e não querem nem saber se existe pesca ou não. O pessoal que mora na praia entende e respeita essa prática. Muitos surfistas inclusive ajudam os pescadores a puxar as redes e aproveitam pra comer tainha na brasa com os amigos.
Um documentário sobre a pesca da tainha pode ser visto no site
http://www.youtube.com/watch?v=4WH9iTzB5H8O LADO DOS SURFISTASO surf é o terceiro esporte mais praticado no Brasil, possuindo milhares de praticantes em todo o território nacional, tornando-se mais do que um simples esporte, mas a diversão, a religião e a profissão de muitas pessoas, de diferentes, dentre mais diversas classes sociais. Vemos isso, principalmente no Estado de Santa Catarina, que possui litoral perfeito para a prática do surf, recebendo etapas do circuito mundial de surf profissional (WT e WQS) e um turismo bastante representativo em torno desse esporte. Como mercado, o surf movimenta bilhões de dólares a cada ano. Como promotor do turismo, o surf - ou até mesmo uma única onda específica, movimenta milhões de reais por ano em deferentes cidades ou regiões costeiras. Como esporte, temos um dos circuitos profissionais mais bem pagos do mundo e uma estrutura organizada com federação, associações, fábricas, marcas, atletas e todo um universo voltado para o esporte surf, o que faz gerar muitos empregos, movimentando a economia nacional. Como profissão, o surf é um esporte que sustenta centenas de atletas e famílias, só no Estado de Santa Catarina, são muitas as pessoas, entre atletas amadores e profissionais, que vivem aqui exclusivamente por causa do surf.
Nós surfistas,formamos um grande fatia de mercado consumidor, bem como representamos uma grande classe de cidadãos com poder de voto.
As principais visões e reclamações dos surfistas: 1. Mais do que um praticante esportivo, o surfista é um apaixonado pelo oceano. Um esporte saudável, ecológico, popular, e também uma profissão para muita gente, principalmente em Santa Catarina, onde vivem muitos atletas profissionais. Os surfista (e nessa categoria entra o surf, o kiteSurf, WindSurf, BodyBoard, BodySurf, KayakSurf, o LongBoard, o Tow-In, o StandUp Paddle ou qualquer outra modalidade de esporte aquático no mar), querem garantir o acesso às praias e às ondas, que são território livre no mundo todo, menos em Santa Catarina.
2. Surfistas e pescadores são dois grupos de pessoas que vivem do mar, com o mar, e para estar perto do mesmo. É muito comum acontecer a inter-relação entre as atividades:um surfista também ser pescador, pescadores são também surfistas, ou pai de surfistas. Uma atividade complementa a outra e pode (e deve) transcorrer de forma tranqüila e amistosa. Os surfistas admiram e respeitam a pesca e convivem de forma tranqüila com os pescadores. O contrário é que parece não acontecer. Para os pescadores os surfistas não passam de um bando de desocupados e que só atrapalham a pesca, o que não é verdade.
3. Todo sujeito que surfa no sul do Brasil sabe muito bem que o surfista não espanta a tainha ou os outros peixes. Os cardumes passam no meio dos surfistas chegando a bater nas pernas e nas pranchas, demonstrando que não sentem medo de nós surfistas. Os surfistas não matam e não são predadores dos peixes, não representam qualquer ameaça de perigo às tainhas, que convivem com os surfistas em praticamente todas as praias do sul do Brasil. Existem surfistas e existe a pesca em quase todas as praias e oceanos do mundo. E em nenhum outro lugar o surf é proibido por espantar os peixes. Não existe nenhum estudo que diga que os surfistas na linha da arrebentação afugentem os cardumes, justamente por não oferecermos perigo algum aos peixes.
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Ondas perfeitas e proibidas prejudicam o esporte e o turismo
4. Além de achar uma injustiça essa "lei" imposta pelos pescadores, os amantes das ondas são hostilizados, humilhados e até agredidos, muitas vezes por pessoas alcoolizadas e que em bando ficam perigosas. Os surfistas entendem que é muito mais fácil e cômodo para o pescador brigar na beira da praia com os surfistas do que lutar em Brasília contra seus representantes, que autorizam a pesca industrial próxima à praia, esse com certeza o maior responsável pelo sumiço das tainhas. Pranchas quebradas e destruídas a golpes de facão, surfistas humilhados, agredidos e expulsos da praia são atitudes que sempre existiram, e que deveriam ser tratadas como caso de polícia, e não o contrário.
5. Nos ranchos de pesca, além dos pescadores, encontram-se também, muitas pessoas que passam o dia bebendo e jogando carta. Nem tudo mundo é pescador, mas na hora de cercar ou xingar o surfista, todo mundo vira pescador profissional e quer mesmo é exercer o seu "direito" de mandar na praia. Mais do que pescar.
6. Os pescadores não podem prender, agredir, ofender ou executar a sentença de um surfista. Pescador não é oficial, não é polícia e nem juiz para ter esse poder. Ninguém pode ter tanto poder e muito menos ser um ditador das praias. A época do coronelismo já não acabou e o que todos querem hoje, é respeito.
7. Os surfistas estão levando a fama de espantar os peixes quando é obvia e notória a presença dos imensos e numerosos barcos pesqueiros com seus motores, sonares, barcos de apoio e todos os equipamentos da pesca industrial, essa sim cruel e predatória. Existem ainda as redes de pescas de arrastão não registradas e uma atividade pesqueira que desrespeita o período de desova. Estas atividades obviamente são muito mais danosas ao peixe e ao meio ambiente do que os surfistas, mas nesses assuntos, ousa comentar e discutir.
8. Os surfistas aceitam e respeitam a tradição da pesca, atividade cultural e tradicional de Santa Catarina, mas também ressaltam que aqui existe também um esporte grande, popular e com força crescente, que também tem o direito ao seu espaço. Não é porque a pesca da tainha é tradicional e centenária que ela não possa ser ajustada para uma realidade atual, tanto ecológica quanto social.
9. Existe um acordo, entre surfistas e pescadores, de quando o mar subir e as canoas não puderem entrar, os pescadores abrem as praias para os surfistas. Mas esse acordo nem sempre funciona. São muitos os dias de ondas grandes e mar grosso que passam sem aproveitamento algum para a pesca e proibidos para o surf. Os pescadores costumam não liberar o surf porque, segundo eles, se liberar um dia, os surfistas vão querer surfar em qualquer dia de onda, e isso eles não querem.
O LADO DA TAINHAA tainha sempre foi uma espécie abundante em nosso litoral. A grande maioria delas sai da Lagoa dos Patos e das inúmeras lagoas de água doce para desovar no mar. É uma espécie comum em todo o litoral brasileiro.
Andando sempre em grandes cardumes, as tainhas passeiam próximas as praias e nessa época do ano viram um grande e lucrativo negócio para as empresas de pesca industrial e para os pescadores artesanais. É a chamada "tainha dos ovos de ouro", que carregadas de ovas, passam a ser agressivamente perseguidas, pois além de lucrar com a venda dos peixes, os pescadores lucram também vendendo as ovas.
Antigamente, a pesca artesanal correspondia a quase 100% da pesca da tainha. Hoje, 90% da pesca da tainha correspondem à pesca industrial, que está acabando com os cardumes e deixando cada vez menos peixe para os pescadores artesanais, que usam redes de pesca próximas a praia. Os grandes barcos pesqueiros estão cada vez mais próximos da costa, pegando tudo que aparece na frente, e todos perdem com esse tipo de pesca. Principalmente a tainha.
O Ibama, órgão que regulamenta a pesca no litoral brasileiro. Somente no ano passado determinou defeso em favor da Tainha, onde ficou decidido que ate o dia 15 de julho, os pescadores não podem pescar a espécie devido ao período de desova da espécie.
Um bom exemplo na lida com a tainha aconteceu na cidade de Rio Grande, no extremo sul do Rio Grande do Sul, aconteceram diversas reuniões (e discussões) com os pescadores para que estes fossem conscientizados a ficar 1 ano sem pescar na época de desova. Depois de muita luta, conseguiram. No ano seguinte a quantidade de peixes pescados foi mais do que o triplo do ano anterior. Ou seja, os pescadores deveriam se unir e brigar forte no que diz respeito a proteção da pesca artesanal e da própria tainha. Principalmente contra os barcos pesqueiros que passeiam próximos a costa, afinal são estes os principais responsáveis pelo fim não só das tainhas, como de muitas outras espécies.
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Se não houver uma pesca planejada e protegida, a tainha pode acabar.
A grande questão aqui é como a tainha vai conseguir se reproduzir se são pescadas e mortas ainda com suas ovas? Como a espécie vai continuar alimentando e abastecendo as famílias de pescadores artesanais, se a pesca industrial continuar tão agressiva e predatória?
Segundo o IBAMA, considerando que "a tainha encontra-se classificada como espécie sobrexplotada, integrante do Anexo II da Instrução Normativa/MMA N.° 05, de 21 de maio de 2004, com demanda para elaboração e implementação de Plano de Gestão, num prazo de 05 anos, desde a data de sua publicação;
Considerando que a avaliação dos estudos disponíveis e das questões apresentadas, sugeriu urgência quanto à definição de medidas de ordenamento eficazes, que possam orientar corretamente a prática dos produtores artesanais e industriais, possibilitando tanto a proteção do período mais vulnerável do ciclo de vida da tainha, a recuperação dos estoques, a manutenção da atividade e a redução dos conflitos";
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O surf é um dos esportes mais praticados no Estado de Santa Catarina. Gabriel "Banana", local de Garopaba, surfando na Praia da Ferrugem, um dos poucos picos liberados na Região de Garopaba.
O LADO DO TURISMOO surf é um dos esportes mais praticados no Brasil e no mundo, sendo o principal esporte aquático do país, junto com a natação. Viagens em busca de praias e de ondas é um dos principais e dos mais constantes movimentos turísticos em direção a costa catarinense. No verão e no inverno, calor ou com frio, faça chuva ou faça sol, centenas de surfistas com suas namoradas, amigos ou famílias, partem em direção as praias de Santa Catarina, deixando seu dinheiro nos postos de gasolina, supermercados, farmácias, pousadas, hotéis, padarias e no comércio local, gerando uma renda muito bem distribuída. Uma região com ondas de qualidade pode ter uma receita de milhões de reais por ano, gerados diretamente por esse grupo de turistas. Se uma onda dessas entrar para circuito turístico desta tribo, é golaço na certa. Atrás de uma onda de qualidade vêm os surfistas, as namoradas, as famílias, a moda, a mídia e mais surfistas, aumentando cada vez mais o volume de dinheiro que torna sadia a vida financeira das cidades costeiras. O problema é que a maioria dos nossos políticos não têm essa visão política. A politicagem de muitos de nossos prefeitos e secretários de turismo focam mais nos benefícios imediatos do que nas estratégias turísticas de médio prazo.
Outro ponto bastante discutido pelos surfistas é o fato de o turismo formado pelo surf gerar muito mais dinheiro para as cidades pesqueiras do que a pesca artesanal. Tornando o lucro mais bem distribuído nas pousadas, hotéis, mercados e em todo o comércio das cidades. Todo mundo lucra com esse turismo. Valendo salientar que durante os meses de inverno, quando nossas praias ficam vazias, a economia das famílias e da cidade sofre uma queda brusca. A situação piora quando se proíbe o surf e muitas pessoas deixam de vir para as praias de Santa Catarina por causa da pesca da tainha. Sendo ainda mais agravada, quando algumas dezenas ou centenas de sites (e em diversas idiomas), relatam que durante os meses da pesca da tainha as praias catarinenses estão fechadas para a prática de esportes aquáticos e que o surf está proibido. Muitos desses sites comentam sobre a agressividade dos pescadores com quem tenta entrar na água durante a época de pesca. É o tipo de propaganda que não ajuda muito.
A gigantesca maioria de nossas praias não possui indústrias ou um comércio forte, que sobreviva fora da temporada de verão, tendo sua economia sustentada pelo serviço público ou do turismo. Ao proibir as praias, prejudicamos o turismo, que precisa de mais gente nas praias, e não de proibições. Se o turista não deixar aqui um pouco do seu dinheiro, todos saem perdendo, principalmente as cidades e praias.
Existe também um outro seguimento do turismo, que embora menor movimenta a região, que é formado por apreciadores da pesca, pessoas que vem a praia para acompanhar a movimentação dos pescadores com suas redes e a pesca da tainha. São os casais, os aposentados e as famílias que admiram a pesca da tainha, e que aproveitam para comprar seu peixe fresquinho, direto das mãos do pescador. Esse turismo também é muito bem vindo e nossas prefeituras deveriam incentivá-lo, já que promovem e valorizam a profissão do pescador. Festivais da Tainha e Festivais de Inverno deveriam ser rotina em nossas praias, tudo para atrair o turista , criando um outro seguimento para a economia, com a venda de produtos e serviços locais, em cada cidade.
Do ponto de vista das cidades litorâneas, basicamente dependentes da atividade turística, tanto o turismo gerado pelo surf como aquele baseado na pesca são importantes e valiosos na vida e na economia de cada uma destas cidades costeiras. E todas as ações para atrair e agradar esses turistas devem ser promovidas em prol do desenvolvimento sustentável de cada cidade ou região.
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Barcos de pesca ultra equipados e bem pertinho da praia, em Garopaba. Foto DadáSouza
O LADO DA LEINão sou advogado e não entendo muito de leis, por isso vou ser bem breve. De fato, e qualquer leigo sabe, não existe uma lei que proíba as pessoas de entrarem no mar. E aqui existem muitos pontos a serem considerados. Primeiro, é que a Portaria da Capitania dos Portos que proibia o surf foi revogada com o surgimento da Instrução Normativa número 171, de 9 de maio de 2008, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). A instrução normativa aborda a pesca da tainha, e segundo o IBAMA não há nenhuma especificação quanto a proibição a prática do surf, pois esse assunto não é da sua competência. Desta forma, a proibição de pessoas livres entrarem no mar para pegar ondas, é ilegítima. Vale lembrar também que mesmo que essa lei fosse legítima, ela deveria ser executada por agentes públicos responsáveis, e nunca pelos próprios pescadores, como vinha acontecendo. Na verdade, o ato de proibir alguém de usufruir da praia, isso sim é crime. Se houver constrangimento ou violência, as penas podem aumentar ainda mais. O mais certo a se fazer, em caso de violência ou de ameaças, é procurar a polícia e fazer valer o seu direito de cidadão. Se ninguém denunciar, os abusos contra os esportistas continuarão. Os surfistas estão impedidos de entrar no mar porque são acusados de espantar o peixe, acusação essa que não tem lógica ou comprovação científica. O que existe hoje em Santa Catarina e que vem funcionando razoavelmente bem é um acordo, que foi feito em Florianópolis, onde o vereador Xande Fontes, na época também Presidente da Federação Catarinense de Surf, se reuniu com as autoridades e representantes da pesca e firmou um termo de compromisso entre surfistas e pescadores, onde durante os dois meses da pesca, o surf ficaria restrito a poucas praias por região, em favor do respeito à cultura da pesca.
Os pescadores, claro, esperam que haja a colaboração dos surfistas para que a pesca continue fazendo parte da cultura e da tradição de Santa Catarina. Os surfistas, por sua vez, percebem a necessidade de mais união e estão amadurecendo sua consciência social , o que os levarão a lutar mais para fazer valer o seu direito de cidadão.
Na verdade muitas praias já não fazem mais a tal proibição: Quando tem peixe, os surfistas saem e ajudam a puxar a rede, é a melhor conciliação possível.
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A Praia da Ferrugem tem o seu canto norte sempre liberado. Na foto o local Roni Ronaldo fazendo o seu treino diário. Foto DadáSouza
AS CONCLUSÕES E OS CAMINHOS PARA O FUTUROTodos esperam que o bom senso e a boa relação entre surfistas e pescadores prevaleçam sobre a ignorância, e que os dois lados envolvidos tenham os seus direitos assegurados. Que todos os surfistas e que todos os pescadores possam praticar seu esporte/profissão com liberdade, já que dos dois lados temos praticantes amadores e apaixonados e também gente profissional, que sobrevivem, seja da prática do surf ou da pesca. Duas atividades livres por excelência.
Com as brigas e as proibições, quem sai perdendo são as cidades costeiras, que deixam de arrecadar muito mais dinheiro com o turismo. As cidades que possuem praias com ondas de qualidade sabem muito bem o quanto o surf representa na sua economia, principalmente nos meses de inverno. Afinal de contas, junto com o surfista vêm as namoradas, os amigos, as famílias, as festas.. E mais surfistas.. e mais amigos..
Como surfista que mora na praia e convive lado a lado com os pescadores, reconheço que devemos respeitar o pescador e suas tradições. Admiro a pesca, os pescadores e sua batalha para conseguir o seu sustento e o nosso alimento. Como bem diz o Gustavo Otto, do blog Surf4ever (http://surf4ever.wordpress.com), "Sou a favor da preservação da tradição Açoriana da Pesca da Tainha. É parte da cultura e da economia da nossa cidade, assim como em outras cidades catarinenses e brasileiras, e deve ser preservada, sempre. Saborear uma boa Tainha também pesa nesse apoio, não há como negar. Acho que devemos olhar pra frente, esquecer rixas do passado e pensar em como Surfistas e Pescadores podem conviver pacificamente, negociando quando for possível (grandes ondulações que impossibilitam a entradas dos barcos, após um cerco bem sucedido, delimitação de áreas, etc)".
A proibição ao surf é um crime que fere o direito de ir e vir de qualquer cidadão, ainda mais nas praias, que são públicas e território livre. Essa “lei” deve acabar em breve, visto que não possui grandes fundamentos. Existe mais interesse por votos nessa questão, do que necessidade real de fechar alguma praia. A mentalidade turística e esportiva deve prevalecer nesse sentido liberando as praias e as ondas para todos.
A grande maioria dos problemas acontece com os surfistas de final de semana e com os turistas, que desconhecem as regras locais, chegam à praia com uma “fome de ondas” maior do que o respeito aos nativos e aos locais. E também com os pescadores agressivos, que abusam da “autoridade” e agem como polícia e como juiz, julgando e executando suas leis diante de encurralados surfistas. Mas no geral, o surfista nativo ou morador da praia conhece as regras e respeitam o pescador, negociando com respeito. Estes sempre conseguem surfar boas ondas nos picos permitidos.
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A grande luta deve acontecer mesmo, é contra a poderosa indústria pesqueira. Os pescadores artesanais sofrem para conseguir as sobras da pesca industrial e em breve não restará nada para o pescador tradicional. Enquanto os pescadores artesanais ainda utilizam técnicas rudimentares para identificar os cardumes no mar, as grandes embarcações utilizam sonares que localizam os cardumes a cinco milhas de distância.
Uma concorrência bastante injusta. O futuro da pesca artesanal depende da ajuda de todos. A atividade já está quase desaparecendo e deve ser incentivada e promovida com eventos e com incentivos do governo e das prefeituras, caso contrário corre o risco de morrer. Pescadores e surfistas, juntos, podem lutar contra a pesca industrial da tainha e assegurar o futuro desse tipo de pesca exclusivamente para o pescador artesanal. Podem lutar pela preservação e conservação das nossas praias e em projetos comunitários e sociais.
Se essas duas categorias parassem de brigar e passassem a se unir para lutar a favor de nossas praias, do nosso mar, muita coisa poderia mudar. E precisa mudar. A preservação e o uso inteligente dos recursos do mar devem ser urgentemente reavaliados e evoluídos, caso contrário a pesca acaba.
Mas visões a parte, o que não pode mais acontecer, é o clima de agressividade e essa guerra (as vezes fria e as vezes bem quente) entre surfistas e pescadores. A realidade atual, com surfistas sendo ameaçados ou até apanhando na beira da praia, com pranchas sendo destruídas sem piedade, muitas vezes por pessoas totalmente embriagadas que chegam em bando. Essa realidade é que não pode continuar. Durante os melhores meses do ano (para a pesca e para o surf) um clima chato acaba imperando na maioria das praias catarinenses. Em Garopaba, os pescadores não querem mais os carros na praia porque os carros espantam o peixe. (pessoalmente, acho que os carros não deveriam entrar nunca nem praia alguma). Julgando-se os donos da praia e verdadeira autoridade, os pescadores cerraram pinheiros, fechando o acesso ao canto sul da Praia da Ferrugem. E isso com os carros ainda na praia. A radicalidade e o coronelismo nativo não podem mais prevalecer sobre o bom senso, sobre as leis e contra um esporte saudável e ecológico.
Surfistas e pescadores são os dois grupos de pessoas que mais tem contato, respeito e amor com o oceano. E devem achar um meio pacifico de lidar com a questão. Sem ignorância, sem arbitrariedade, e utilizando sempre o bom senso.
Ambas as atividades são típicas em Santa Catarina, e é preciso que haja uma convivência harmônica entre as partes. Vale lembrar que muitos dos pescadores são surfistas, e que muitos surfistas são pescadores, e costumam fazer parcerias para realizar os arrastões da tainha. Toda essa confusão se resume a duas palavras: educação e respeito. E isso vale para os surfistas e para os pescadores.
Esperamos que as entidades envolvidas (IBAMA, Capitania dos Portos, Fecasurf, Associação de Pesca) acabem de vez com essa situação ridícula de proibir as praias para as pessoas de bem, nessa espécie de apartheid da parafina.
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Pescadores de Garopaba se lançam ao mar para cercar o cardume. Foto DadáSouza
FIQUE LIGADO!Atualmente, as praias são liberadas ou proibidas de acordo com cada região. Algumas praias sinalizam se haverá pesca ou surf através de bandeiras de sinalização. Quando há cardumes na região, bandeiras são hasteadas informando a proibição do surf. Com o mar grande, quando sair de barco torna-se perigoso, as bandeiras são baixadas e a praia liberada para o surf. Em outros locais rola um sistema de cores: bandeira branca: surf; bandeira vermelha: pesca.
Esse sistema vem funcionando razoavelmente bem e os surfistas costumam respeitar a sinalização. Alguns trechos, de algumas praias, estão sempre abertos para a prática do surf. Mas nem sempre são os picos com boas condições e esse que é o problema. Se as únicas praias liberadas quebrarem boas ondas com vento nordeste, o que farão os surfistas nos dias de vento sul? Para evitar problemas, informe-se antes de encarar o surf aqui nas praias catarinenses e, na dúvida, pergunte sempre antes de cair no mar qual é a situação do local.
Mais informações pode ser lida nos sites abaixo http://www.ibama.gov.br/cepsul/index.php?id_menu=137&id_arq=21http://maurioborges.blogspot.com/2009/05/bem-vindo-faixa-de-gaza.htmlhttp://surf4ever.wordpress.com/2007/05/01/%C2%BB-tainha-na-area/http://waves.terra.com.br/surf/noticia/o-lado-dos-pescadores/36405http://www.floripaturbo.com.br/noticias/pesca-da-tainha.phphttp://revistadasaguas.pgr.mpf.gov.br/edicoes-da-revista/edicao-7/edicoes-da-revista/edicao-7/artigos/administracao-de-conflitos-no-mar-de-santa-catarina-pescadores-artesanais-x-pescadores-industriaishttp://www.swellfarol.com.br/noticias/0/522/pesca_da_tainha_2009_-_proibir_e_crime