O Surf Ranch Pro
foi um passo inédito na história do surf mundial. Já havíamos visto campeonatos
em piscinas a muito tempo atrás, mas essa foi a primeira vez que uma etapa do
circuito mundial da WSL aconteceu em uma onda artificial de alta performance e
com um novo formato de competição. Uma mudança e tanto no sempre tão
conservador circuito mundial de surf. Muita gente gostou e muita gente não
gostou, o fato é que o evento rodou redondinho (tirando aquele episódio de
mandarem repetir as ondas) e teve um saldo mais positivo do que negativo.
Ninguém pode reclamar que não teve onda. Muita gente
comentou que gostaria de ver sessões com mais personalidade nessa onda do
Kelly, mas não só as ondas estavam lá como tinham hora exata para quebrar e
sessões de tubo e de manobra. Todo mundo surfou na mesma condição e as ondas
eram rápidas, perfeitas e, de certa forma, desafiadoras. Não teve quem não
queimou as pernas tentando vencer a locomotiva.
A WSL também entrou para a história ao decretar que homens e mulheres receberão a mesma premiação em dinheiro. Em um
esporte tradicionalmente comandado e administrado por homens, surpreendeu o
reconhecimento da igualdade. Justíssimo, até porque nessa mesma piscina de ondas
algumas mulheres definitivamente surfaram melhor que alguns homens. Ponto para
a WSL.
Depois de dois dias de apresentações, os finalistas foram Gabriel
Medina, Julian Wilson, Filipe Toledo, Owen Wright, Kanoa Igarashi, Miguel Pupo,
Sebastian Zietz e Kelly Slater. Julian e Kelly chegaram às finais deixando
muita gente desconfiada do julgamento e da lesão de Slater, que ninguém sabe se
ainda existe, já que ele vem surfando e competindo quando quer.
Sebastian Zietz (HAW), Miguel Pupo (BRA), Kelly Slater (USA) e Owen Wright (AUS)
surfaram com dificuldade e acabaram cometendo erros fatais em suas primeiras ondas. Filipe Toledo (BRA) foi o primeiro a surfar bem, fez uma boa
esquerda de 13 manobras e caiu antes de chegar no tubo. Na direita Filipinho
fez 4 manobras, surfou um tubo de 11 segundos, fez 3 manobras fortes, pegou um
tubo profundo e deu um aéreo rodando no final da onda e marcou 8.33. Foi o primeiro a finalizar a
direita sem erros. Kanoa Igarashi (JAP)
não fez uma boa esquerda e caiu na metade do percurso. Na direita ele surfou
muito bem mas caiu no aéreo de finalização e marcou 8.17. Kanoa ganhou uma
nota excelente em uma onda incompleta, coisa que até então não tinha acontecido. Julian Wilson (AUS) fez uma sequencia
de 13 manobras meio burocráticas e errou o aéreo no final e marcou 5.73. Na
direita Julian caiu no primeiro tubo sem mostrar nada demais. Gabriel Medina (BRA) errou logo no
começo da sua primeira esquerda. Na direita Medina fez 3 manobras, pegou um excelente
tubo de qw segundos, fez uma sequencia de manobras fortes, entubou no inside e
deu um aéreo rodando no final e marcou 8.73. A primeira rodada terminou com
Filipe em 1º, Kanoa em 2º, Gabriel Medina em 3º e Kelly Slater em 4º. Entre as
meninas Carissa Moore fez incríveis 8.33
e 9.00 e saiu na frente, com Lakey Peterson ficou em 2º, Caroline Marks em 3º e
Stephanie Gilmore em 4º.
SEGUNDA RODADA
Sebastian Zietz
surfou a esquerda de um jeito meio burocrático e caiu na metade do percurso. Na
direita Seabass fez sua primeira boa onda, só caiu na finalização e marcou 7.90.
Passou de 8º para 2º. Miguel Pupo
surfou uma ótima esquerda, destruiu sua onda, levantou a torcida e marcou 8.13.
Na direita Miguelito errou no primeiro tubo e não fez uma boa onda. Kelly Slater errou logo no início da
esquerda. Na direita Kelly surfou como nos velhos tempos e fez 8.60. Com essa
onda Slater passou de 4º para 2º. Owen
Wright surfou uma ótima esquerda, só errou a manobra de finalização e
marcou 7.43. Trocou a nota. Na direita Owen foi mais burocrático e acabou
caindo dentro do primeiro tubo. Filipe
Toledo tinha que trocar 6.83 na sua esquerda. Surfou agressivo, rápido, mas
não saiu do tubo e marcou 6.20. Na direita Filipe foi monstruoso e surfou a melhor
onda de todo o campeonato, deveria ter ganhado uma nota 10 unânime e marcou 9.80.
Pouco mais de um ponto de diferença entre as
ondas do Kelly e do Filipe foi algo tão feio que expôs os juízes ao ridiculo. Kanoa Igarashi caiu na esquerda e fez uma boa direita, mas não
trocou suas notas. Julian Wilson
surfou burocrático demais na sua esquerda, alisou demais telegrafando o aéreo
do final, e caiu na manobra de finalização. Na direita Julian até fez uma boa
onda, mas caiu na finalização. O vice-lider do ranking foi para a última
colocação. Gabriel Medina precisava
fazer uma boa esquerda, surfou um pouco mais seguro, finalizou com um aéreo kerrupt
no final da onda e marcou 8.53. Na direita surfou com muita potência, entubou
fundo e com muita técnica, mas caiu na última manobra. Medina finalizou a segunda rodada na 1ª
colocação, com Filipe Toledo em 2º, Kelly Slater em 3º e Sebastian Zietz em 4º.
Entre as meninas Carissa Moore melhorou
suas notas e disparou na liderança. As demais posições não se alteraram.
Depois disso alguém falou que as ondas não foram iguais para
todos e que os e as surfistas teriam o
direito de surfar novamente para a esquerda. Problemas com o vento? Com o fluxo
de agua? Com o operador da maquina? Para variar ninguém falou nada. Quem se
beneficiou com a onda extra foi Kanoa Igarashi, que de 5º passou para 3º, rebaixando
Kelly e Sebastian Zietz, e Gabriel Medina, que já estava em 1º e melhorou sua
nota na esquerda ampliando a sua vantagem.
TERCEIRA RODADA
Sebastian Zietz bem
que lutou para tentar surfar bem, mas simplesmente não conseguiu. De qualquer
maneira fez sua melhor nota na esquerda na competição: 7.17 e finalizou a etapa
na 7ª colocação.
Miguel Pupo tinha 8.13 na esquerda,
surfou uma boa onda, mas errou na finalização e não melhorou sua nota. Na
direita Miguel Pupo tinha 4.83, uma nota fácil de trocar, mas caiu no primeiro
tubo e não conseguiu trocar sua nota e terminou o evento na 8ª colocação. Kelly
Slater surfou uma ótima esquerda, sua melhor esquerda no evento. Kelly
precisava de 9.13 para superar a onda de Medina, mas marcou 7.67. Na direita
Kelly não foi bem e terminou a etapa na 3ª colocação, seu melhor resultado no
ano. Owen Wright, que vinha sendo um
dos melhores surfistas da competição nos primeiros dias, muito pouco mostrou
nas finais. Na esquerda Owen caiu logo no início da onda e na direita fez uma
onda boa mas um tanto conservadora e ganhou 7.97 pontos e terminou o evento na
5ª colocação. Filipe Toledo precisava
melhorar um 6.83 na esquerda, surfou bem e com muita pressão, mas caiu no aéreo
de finalização. Marcou 7.23. Na direita Filipe não conseguiu melhorar sua onda.
Filipe terminou o evento na 2ª colocação e continua na liderança do ranking. Kanoa Igarashi surfou mal na esquerda,
surfou mal na direita e não conseguiu melhorar sua posição e terminou o evento na
4ª colocação. Julian Wilson que não
fez nenhuma boa apresentação nas finais, foi para a esquerda precisando
melhorar um 6,57, não conseguiu e com isso o título da etapa foi para o
brasileiro Gabriel Medina, que se consagrou Campeão do Surf Ranch Pro.
Entre as meninas Carissa Moore fez uma campanha espetacular no Surf Ranch e
foi a grande campeã do evento surfando com grande competência. Stephanie
Gilmore surfou uma excelente direita, fez 8.87 e ficou na 2ª colocação. Lakey
Peterson ficou em 3ª e Caroline Marks (USA) na 4ª colocação.
Filipe Toledo, vice-campeão do Surf Ranch Pro 2018 e líder do ranking. Foto WSL/Cestari
OS PONTOS FRACOS DO EVENTO
Como ainda estamos vendo os primeiros eventos em piscinas com onda, muita coisa ainda precisa melhorar, por isso listamos aqui as principais reclamações do público sobre o evento.
Uma das coisas que a galera na web mais reclamou é que na piscina não tem aquela emoção da entrada da série, não
tem disputa de onda, nem briga pela prioridade, nem se testa o posicionamento
dos surfistas. Tudo é muito mecânico, muito igual, muito perfeitinho, mas sem sal e, principalmente, sem pimenta. Talvez ainda precisemos nos acostumar com o surf fora da sua natureza.
Um dos maiores problemas desse evento, segundo os competidores,
é que simplesmente não dava para treinar, nem fazer aquele surf matinal de aquecimento, muito menos testar quilhas ou pranchas. Sem poder treinar antes da competição, só
conseguiu entrar em sintonia com as ondas quem já tinha experiência na piscina.
Isso na oitava etapa do tour, com tanta gente precisando desesperadamente de
pontos para se classificar para o ano que vem.
Muita gente ficou mal da cabeça. Se a gente
levar em consideração que o Kelly já fechou Fiji antes de uma etapa para que
ninguém mais pudesse treinar, não é surpresa ele fazer isso em sua própria
piscina.
As ondas também deixaram muita gente confusa. Apesar de
serem todas iguais, definitivamente não eram todas iguais. Algumas eram maiores
e algumas menores. Não se sabe se foi por causa do vento, do fluxo de água ou se
era coisa de quem operava a máquina. Ainda sobre as ondas, a piscina aparentemente
seguiu a mesma regra do restante do circuito e valorizou bem mais as direitas.
Impossível não admitir que as direitas da piscina são muito melhores do que as
esquerdas.
As ondas perfeitas do Surf Ranch devem ser ótimas para se
surfar. Ninguém duvida disso. Mas para quem assistiu o evento foi um pouco
monótono. Ondas sempre iguais, muita propaganda e muito pouca emoção. Faltou
colocarem as notas na tela e faltou de vez em quando repetirem as melhores
ondas para que todo mundo pudesse comparar melhor as ondas e as notas. Não se
sabe se foi esquecimento ou se foi proposital, afinal o surf tem um público apaixonado, que analisa criticamente o julgamento da WSL na web e isso tem desagradado o "dono" da WSL.
As ondas do Surf Ranch também receberam críticas. São
lindas, perfeitas e velozes. Por outro lado, são ondas leves, rápidas demais,
burocráticas demais e que nem sempre proporcionam grandes manobras. Raros foram
os surfistas que conseguiram inverter o bico da prancha em suas rasgadas. Definitivamente
surfar bem nessas ondas não para qualquer um. A diferença entre os melhores do
tour para os coadjuvantes, que já é enorme, se acentuou bastante.
Surfar na onda artificial do Surf Ranch é muito diferente do
que surfar no oceano. Na piscina você sabe que vai surfar, sabe que a onda vai
entrar e precisa e que você precisa planejar muito bem a linha de surf para
aproveitar as muito bem definidas sessões de cada onda. Alguns não entenderam
isso.
No meio de um circuito mundial da WSL essa etapa pareceu meio perdida. Outro formato, outro tipo de onda, outras regras.... Mas definitivamente
é uma ideia que pode ser adotada com sucesso pelos jogos olímpicos e uma ótima oportunidade para se criar um circuito paralelo.
O JULGAMENTO
Com ondas tão iguais, o julgamento perde muito da subjetividade
(pelo menos deveria) e a performance dos atletas é o que faz a diferença. Sem
precisar se preocupar com as ondas, os juízes teoricamente podem prestar mais
atenção nos detalhes e descontar todos os erros cometidos, tal qual acontece na
ginástica olímpica. Mas a verdade é que uma dúvida ficou no ar: será que podemos
dizer que os juízes da WSL estão acompanhando a evolução do surf?
Compara aí o 9.80 do Filipe Toledo com as notas mais altas de seus adversários e isso fica claro como o sol.
O julgamento, que já vinha sendo o Calcanhar de Aquiles da
WSL desde os tempos da ASP, continua colocando em cheque a credibilidade do
circuito para muita gente. Não são poucos os confrontos que tem seu resultado
questionado e cercados de polêmica. No Surf Ranch Pro, com ondas aparentemente
iguais para todos, o julgamento mostrou a mesma inconsistência das outras
etapas e muitos resultados foram questionados e ridicularizados na internet. Nem os atletas, nem os jornalistas, nem o público está entendendo.
A próxima etapa acontece de 03 a 14 de outubro na França.